29.6.12

Algo de podre no reino de Rio das Ostras

Décimo-terceiro, treze, minha colocação. O número poderia sugerir que houve algum tipo de azar, mas esta conclusão seria bastante equivocada. Não foi o melhor contra-relógio da minha vida (o prólogo das 500 Millas em 2008, ou Hirschbachtal no ano passado, dividem esse título), mas com certeza não foi o pior. Fiquei, poderia dizer, orgulhoso da minha capacidade em não apenas manter a bicicleta em pé, mas fazê-lo mantendo uma posição relaxada e aerodinâmica. Não consegui manter o ritmo que planejava ao longo de um dos longos trechos contra o vento, mas se fiquei aquém, foi por uma pequena fração da potência que almejava. Ao mesmo tempo, acho que consegui dosar bem os esforços nas subidas e descidas, ultrapassando quatro atletas no percurso, e, chegando ao final, tinha a agradável (?!) sensação de ter esvaziado completamente o tanque - o que era comprovado pelo fato de, várias horas após a prova, ainda sentir nas pernas as consequências do esforço.

Tamanha foi então a minha surpresa ao descobrir que, ao cruzar a linha, não havia feito o melhor tempo. Tampouco estava em posição de disputar o pódium - tinha apenas a 7a colocação, com pouco menos da metade dos competidores ainda por completar o percurso. Com a chegada destes, que incluiam alguns dos nomes mais cotados para a vitória, meu nome caiu mais algumas posições na tabela. Ao final, o 13. Para quem pretendia disputar o pódium, deveras frustrante.

Teria eu me enganado tamanhamente ao estimar minha capacidade, ou subestimado de forma grosseira meus adversários? Fui para a competição com uma forma física certamente entre as melhores que já alcancei e, ao contrário de participações anteriores, desta vez tive uma consistência invejável - sem gripes, acidentes ou viagens capazes de comprometer os treinos que, desde o início do ano, foram direcionados pare este contra-relógio. Tenho a minha disposição um dos melhores equipamentos disponíveis, e seguramente a maior atenção a pequenos detalhes - como o posicionamento na bicicleta, ou pequenas modificações que fizemos em nossos uniformes para reduzir ainda mais o arrasto aerodinâmico. Em outras competições na Alemanha, já tive a oportunidade de comparar meu desempenho com outros atletas que compartilharam os dados de suas provas - uma das vantagens de um medidor de potência instalado na bike é, justamente, a possibilidade de analisar objetivamente estas diferenças de performance - e evidenciei que a soma destes pequenos ganhos me economiza quase 10% do custo energético, se comparado com outros atletas que, igualmente, tem acesso a bons equipamentos e razoavelmente bem posicionados em suas bikes. Observando a posição dos demais atletas em Rio das Ostras, bem como suas configurações de equipamentos, tinha certeza de que apenas neste aspecto eu já contabilizava uma vantagem inicial sobre os demais competidores.

Ainda como parte da argumentação, posso comparar minhas performances àquelas de dois amigos em outras provas: Fritz, ex-colega da equipe de Herpersdorf, e Giulio, meu colega na Magnesium Pur. No Campeonato Alemão de Contra-Relógio, disputado no mesmo final de semana que a prova do Campeonato Brasileiro, Fritz foi 6o, e Giulio, 9o. Deixando de lado o vencedor da prova, o fenomenoso Tony Martin - atual campeão mundial da modalidade e um dos mais cotados para o ouro olímpico - comparo os tempos de meus colegas com o 2o colocado, Bert Grabsch - campeão mundial em 2008, e, juntamente com seu conterrâneo Martin, tido como um dos maiores especialistas em atividade na modalidade. Na distância de 40.6km, Fritz e Giulio ficaram, respectivamente, 2m11 e 3m07s atrás do ex-campeão mundial - ou 3.2 e 4.6 segundos por kilômetro. Giulio, a quem eu havia batido por 17s em um 'ensaio' de 22km na semana anterior ao meu embarque, afirmou que também não havia feito sua melhor prova. Fazendo uso de uma extrapolação, baseado nas provas e treinos que fizemos juntos, poderia estimar que, caso eu tivesse a oportunidade de disputar o título nacional do país do chucrute, teria perdido de 4 a 5 segundos por kilômetro. Mas, por motivos de força maior, me via disputando a prova tupiniquim, e neste, na distância de 29km, fiquei 2m28s atrás do vencedor - ou 5.1 segundos por kilômetro. Seria um déficit perfeitamente cabível para com atletas do gabarito europeu - mas, até onde sei, nenhum dos medalhistas da prova figurou de forma expressiva em qualquer competição internacional.

Não intenciono exorcizar nenhum dos participantes, especialmente sem provas. Ainda assim, são fatos - foi coroado um campeão que já retornou positivo em um exame anti-doping; e pelo menos outros três atletas que figuravam no top 15 já foram citados por violações relacionadas a substâncias controladas. Lamento tremendamente o fato de uma prova da importância de um campeonato nacional não contar com controles anti-dopagem - controles estes que ajudariam a dar alguma credibilidade ao nosso esporte, infelizmente manchado por todas estas ocorrências. Se fico chateado com o resultado, é apenas pois esperava que a participação nesta prova - que, como coloquei nos posts anteriores, servia apenas como coroação de um processo muito maior - não ficasse marcada pelo sabor azedo da suspeita de uma trapaça generalizada. Mas, voltando para casa com a temporada alemã inteira ainda por se desenrolar, me alegro em deixar para trás as desavenças com o ciclismo brasileiro. É hora de seguir em frente. Kette rechts!

1 comment:

Ivan Boesing said...

Ricardo, que bom que tivestes a tranquilidade de escrever. Escrever ou falar com alguém é quase a mesma coisa, é terapia. Ajuda a expulsar os maus espíritos, eles existindo ou não.
Bola pra frente, o que importa é o que o teu eu diz pra ti.
Ivan